Sério, vocês ainda acham que o rock é sinônimo de rebeldia? Eu tenho minhas dúvidas. Tirando uma galera de um certo circuito hardcore de fundo de quintal, que mantém uma pegada mais agressive, o resto está pasteurizado. Vejam bem, questão de ponto de vista e, de repente, o ângulo de quem me lê pode ser diferente.
Mas o fato é que minhas experiências, particularmente nos shows mainstreans, tornaram-se um programa mais família que ir ao zoológico. No último show do Iron que fui aqui no Rio de Janeiro, na Arena HSBC, estavam vendendo pipoca e pizza na arquibancada. Porra! Pipoca num show de metal? Na fila era raríssimo ver gente fumando, cannabis então se sentia ocasionalmente de forma muito sútil. Eu e meu brother, Fábio Medeiros (@fameso), éramos os tiozinhos incomodando meio-mundo fumando charutos e enfiando o pé na cachacinha mineira que levei na minha garrafinha.
Ah, mas Iron é coisa de criança, poderiam argumentar alguns pseudo-tr00. Beleza, no show do Antrhax e do Misfits, um dos Big Four do Thrash Metal e uma das mais antigas bandas de Hardcore, eu vi estancar uma única briga. Quer dizer, um cara de cabeça raspada, que certamente não era um Careca (nazi), deu um soco num headbanger. Sabe o que o agredido fez? Isso mesmo, tomou outro soco. E depois? Chamou o segurança. Isso mesmo. É muita civilidade num espetáculo de metal pra mim.
Conversando recentemente com dois amigos, o Luciano Mesquita e o Adriano Comissoli (@AComissoli), contávamos sobre as confusões em que nos metemos em shows pela vida a fora. O Luciano se lembrou das brigas insanas durante o Body Count, Pantera, tudo no antigo Imperator, no Méier. Aí o Adriano me saiu com a seguinte pérola: o rock foi mais rebelde e agressivo quando era coisa de fodido. Cacete, é isso. Tive que concordar. Quando o rock era criação de operários, negros excluídos pelo sistema, a pegada era mais forte. Agora virou coisa de classe média intelectualizada. Estou nesse meio, só esclarecendo. Já fui ferrado pobre, agora sou ferrado de classe média, servidor público e pagador de impostos. Mudei, é verdade.
Fiz essa pergunta, a que eu comecei o texto, para outro amigo, o Ricardo Patrício, há um tempo atrás, com o seguinte adendo: será que o funk carioca é mais rebelde que o rock? Resposta dele, apreciador velha-guarda do rock’n roll: muito mais. De fato. No funk tem os proibidões, por exemplo, que fazem apologia das drogas, do sexo, de marginais. São um tapa na cara dos valores burgueses. Quem os cria? Quem os consome? Na esmagadora maioria jovens pobres, negros, excluídos. Claro que já existe uma penetração do funk em outros estratos sociais, mas quando isso acontece sempre existe uma redução na pegada.
Se eu gosto de funk? Não. Minha praia é e sempre será o rock. Se eu gosto de violência, drogas, vulgarização do sexo? Bem, em doses homeopáticas, sim, não serei hipócrita. O rock se construiu sobre essas bases, e o que nos atraía, quem tem mais de 30 anos, era justamente o toque proibido e agressivo do rock. Hoje meus alunos se intitulam roqueiros porque colocaram um alargador de orelha e invadem cemitérios.
Essa mudança de comportamento de quem curte rock é palpável. Não sei se curto, mas são os tempos mudando. Confesso que gosto da antiga barbárie, da insanidade, enfim, creio que seja a proximidade dos quarenta anos que me deixa saudosista. Deixo para vocês as conclusões.